quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Suunto Ambit 3 Sport - Crónica de uma review

The beginning!




O local era Oukaimeden em Marrocos, Alto Atlas. A 2675m de altitude no albergue mais alto de Africa, de seu nome Chez JuJu, o team tuga que foi ao UTAT aguardava pela chegada da refeição. Não estava previsto almoçar em tão "requintado" local, até porque os preços são um pouco abusivos face à concorrência, ou antes à ausência dela. Prefiro sempre uma genuína tasca marroquina, mas o facto do wifi estar fechado no nosso albergue este ano, serviu de engodo e a trupe há 1 dia sem net já estava a salivar para estar online. 

Depois de 1 reboot ao router do albergue a net lá começa a bombar e à velocidade de um caracol (há que partilhar com outras dezenas de clientes) os facebooks lá se vão actualizando. De repente chega o mail que deu origem a esta review. O meu contacto da Amer Sports Espanha diz-me que tem um Suunto Ambit 3 para eu testar e se estiver interessado em analisar e escrever um artigo no blog é só dizer. Uau! Sem querer comparar-me com aquele pessoal que de facto tem algum valor, mas que só é reconhecido lá fora, é um pouco isso que se passa aqui. Desse modo agradeço à Amer Sports a amabilidade e o reconhecimento e espero continuar a merecer a vossa confiança. Pelo minha parte aqui vai o que tenho a dizer do Ambit 3.

Início da coisa

Despachado o UTAT mal tive tempo de regressar ao trabalho, pois o Ambit quase chegava primeiro que eu. A minha ideia inicial era fazer uma comparação com o Fenix 2, um duelo que permitiria eleger o melhor dos relógios com GPS da actualidade. Mas ao analisar melhor o Ambit 3 percebi que não faria sentido tal comparação. Na realidade há vários Ambits 3, vários sabores por assim dizer:
Suunto Ambitt 3 Peak
o Ambit 3 Peak, o Ambit 3 Sport e depois mais uns sabores com vidro de safira e cores, que para o caso não interessam. O safira obviamente o mais caro de todos e os de cores para pessoal colorido pois claro (na realidade são apenas 3 cores, preto, branco e azul)

Suunto Ambit 3 Sport
A questão aqui é que as diferenças, não sendo muitas entre o Peak e o Sport, são suficientes para tornar injusta uma comparação com o Fenix 2 feature a feature, com classificações etc. Assim sendo, o capítulo da comparação olho por olho está encerrado. Não quer dizer que não os compare, mas não vai haver um claro vencedor ou provavelmente um melhor que outro. O concorrente directo do Fenix 2 é o Suunto Ambit Peak. O que me enviaram para analisar é o Suunto Ambit Sport.

A minha ideia com esta review é então fazê-la ao jeito de quem conta uma história. Só para ser diferente e vos obrigar a ler que é uma coisa muito importante e saudável. Se querem respostas rápidas e classificações vão ter de ir a outro site. Aqui vão ter de penar. Ainda por cima é uma crónica, por capítulos, para vos entreter que a vossa vida anda um pouco por baixo para estarem aqui a estas horas a lerem análises de relógios com GPS.

Primeiras Impressões

Estava obviamente super curioso para conhecer o Ambit 3. Depois de ter testado o Ambit original, enviado pela própria Suunto de propósito da Finlândia e do Ambit 2 ter ficado um pouco aquém do que um produto 2.0 merecia, já sabia o que o 3 trazia de novo, mas apreciar ao vivo e com a responsabilidade de testar e reportar, tem outro sabor,

Ainda sem saber as diferenças entre os vários Ambits 3, depois de o colocar no pulso, pensando que era idêntico ao Fenix 2 a primeira impressão foi excelente. A Suunto fabrica excelentes relógios e o Ambit 3 Sport é nesta encarnação um produto altamente refinado. De toque suave, o acabamento fosco mate da caixa é um mimo. No pulso, tirando a antena GPS que faz o relógio não assentar perfeitamente no pulso (pelo menos no meu encavalita um pouco mas nada que não se habitue), é perfeito. Claro que é um relógio com um grande mostrador, mas para quem anda com um Fenix 2 diariamente não há nada de novo aqui. O que há de novo é que o Ambit 3 Sport não tem a mesma bateria do Ambit 3 Peak (nem do Fenix 2). Assim a Suunto consegue fazer um Ambit 3 com metade da autonomia do Ambit 3 Peak  (e do Fenix 2) mas, muito importante, um pouco mais leve e sobretudo um pouco mais fino. Notem as diferenças:


Peso:
         Ambit 3 Peak  - 89g
         Ambit 3 Sport - 81g
         Fenix 2            - 85g

As diferenças podem parecer insignificantes, mas não são. O Ambit 3 Sport é 10% mais leve e 14% mais fino que o Ambit 3 Peak.

É claro que isto não será um factor decisivo na aquisição, mas se não precisam dos extras do Peak então asseguro-vos que o Sport é bem mais interessante até porque custa menos 20% que o Peak (valores de tabela com cinta HRM).
Claro que o vosso pulso vai sentir a diferença pois o Sport é bem mais elegante e confortável. É uma das coisas que noto em comparação com o Fenix 2, que deve ser muito identico ao Peak  em termos de espessura.

Acho que esta estratégia da Suunto é muito acertada. Segmentou o produto, pois nem toda a gente precisa de 15h de autonomia e de barómetro (Peak) e consegue atingir mais clientes que se calhar iam torcer o nariz a usar um relógio tão grande para fazer apenas umas maratonas ou umas provas de trail mais curto. O Sport tem 8h de autonomia no modo 1seg de dados de GPS (ou seja GPS sempre ligado) que é mais do que suficiente para a maioria das pessoas.

Que diferenças há mais entre os 2 modelos? A Suunto responde neste link. Em resumo todas as diferenças se resumem a três coisas. O Peak tem uma bateria com o dobro da autonomia, tem um barómetro atmosférico e um sensor de temperatura.  Se não precisam destes extras o Ambit 3 Sport poderá ser o relógio que procuram e só têm de continuar a ler o próximo capítulo para o saberem.

Seguir para a parte 2 desta análise

sábado, 11 de outubro de 2014

UTAT 2014 - Disseminação!



Em 2012 juntamente com o Luis Canhão descobri o UTAT, Foi uma revelação. A história dessa prova está neste post. Foi a maior aventura da minha vida, vi jeitos de ficar ali na montanha, sofri com o frio, com a dureza das subidas, com uma descida tenebrosa sem fim, mas tudo foi superado. 
E quando nos esquecemos das partes más, fica uma vontade enorme de mostrar aos amigos os tesouros que há no Atlas. Não têm qualquer valor financeiro, o que os torna inestimáveis e muito mais valiosos.

Esta nova viagem ao UTAT surgiu de uma negociação duríssima com o Luis Trindade. Bora fazer a TransGranCanária que depois vou ao UTAT. Bora! E foi assim. 

Depois foi só juntar o maior número de amigos possível. Queria passar a mensagem, quantos mais melhor. Nesta prova é possível conhecer um pouquinho de um país fantástico e quebrar alguns mitos, preconceitos e julgamentos errados sobre o que é Marrocos, obviamente apanhando pelo caminho um brutal e gigantesco empeno, com uma passagem aos 3660m de altitude e mais umas quantas acima dos 3000m. Desenganem-se os que pensam que o UTAT é uma prova vulgar, igual a tantas outras que temos aqui na Europa. Ah e tal 6500 D+, já fiz esta aquela e a outra. Desenganem-se. O Atlas vai cobrar o seu preço e só os mais fortes o vencerão. O tempo máximo de 36h denotam uma aposta da organização em que o maior numero de pessoas acabem a prova. E parece-me acertado dado que este ano em 112 participantes só houve 2 desistências. Chamam-lhe a mais dura prova naquela distância. Se não fôr verdade estão muito perto disso.


Assumi o risco de organizar, tanto quanto possível, uma viagem que ficasse gravada para sempre na memória dos amigos que nos quisessem acompanhar. Voo directo de Lisboa com regresso via Marrakech e pernoita num Riad tão bom quanto em conta. Passear na medina para limpar o ácido lático que restasse, comprar recuerdos para as Marias e para os Manéis e regressar ao lar sem problemas de maior ao fim de 6 dias/5 noites; umas mini-férias.

Não vai ser esse registo que vão aqui encontrar. Estes dias que passámos são património de cada um. Até porque seria exaustivo e aborrecido resumir por palavras tudo o que passámos e nos divertimos. 

Mas quanto à prova vou deixar-vos um pequeno resumo do que é regressar ao UTAT 105Km.

Há 2 tipos de pessoas que gostam de correr em montanha. Os que ainda têm de ir ao UTAT e os que já foram ao UTAT. Dento deste ultimo tipo temos ainda os marados que regressam novamente para um 2º round (diria casmurros). Engraçado como só me comecei a aperceber da loucura que é regressar ali, quando nos abastecimentos me diziam o que vinha a seguir e eu respondia que já sabia pois já tinha feito a prova. Invariavelmente perguntavam-me se não tinha sofrido o suficiente da primeira vez. E de facto ia-lhes dando cada vez mais razão à medida que progredia na prova.

Depois de um começo calmo quanto baste em que tentei chegar com o Paulo Martins o mais fresco possível aos 30km, que é  onde efectivamente começa a prova, enfrentámos a 1ª subida a sério. Dia muito agradável depois de ter conseguido passar aos 3100 metros ainda sem o sol nascer e só de t-shirt. Foi uma excelente estratégia. Nem sei como suportei a ventania horrível e gelada naquele primeiro pico, mas o certo é que a coisa acalmou e ali estávamos nós a subir forte e feio após cerca de 4h. 

O Paulo começa a quebrar e a ir-se abaixo, tonturas, vómitos e eu começo a ver o caso mal parado. Falta muito para acabar a subida pergunta ele aos 2000m. Fingi que nem ouvi a pergunta pois aguardáva-nos subida por mais 2h30, Cada vez mais difícil progredir e depois de pararmos algumas vezes não tive outro remédio senão deixá-lo ali a recuperar. Com uma bela vista e uma boa sombra a pretegê-lo do forte sol que se fazia sentir no vale. Contrariado e triste segui sozinho, Era o primeiro revés da nossa aventura.

Sentia-me forte, os pés a acusarem algum desgaste mas fisicamente estava muito bem. Apenas uma queda em que me recordei que não se deve correr com aneis pois podem prender-se em qualquer sítio e arrancar ou cortar facilmente um dedo. Chego ao Km 68 em pouco mais que 30º lugar e com menos 2h do que em 2012. De facto estou bem melhor. Peço ao podólogo para me dar uma vista de olhos nos pés. Seca-me uma bolha com um produto que não fixei o nome, liga as zonas mais massacradas com tape e fiquei fino. Arranco para a subida dos 3660m como novo, Mantive as 2 horas de diferença e ia fazendo contas. O percurso começa a parecer-me diferente de 2012. A princípio atribuí ao facto de em 2012 ser já de noite quando comecei a subir e este ano ainda dar para ir ver o pôr do sol lá em cima, coisa que nunca imaginei possível. Estava deveras surpreendido e embora soubesse que faltavam apenas 37Km de prova, teriam de ser calmamente feitos em 12h ou perto disso. Mas ainda o dia era uma criança...

Ataco a subida determinado a ver o por do sol lá em cima. Decididamente não reconhecia aquele vale. As paisagens eram de cortar a respiração. Sigo já na minha posição quase definitiva, afasto-me lentamente de companheiros mais lentos a subir mas não vejo ninguém mais acima. Não via, porque de repente alguém a descansar pergunta, Pires?
Era o Trindade que estava a descansar. Depois da felicidade de encontrar alguém para falar ao fim de 7 horas, fiquei preocupado. A pouco e pouco fui-me apercebendo que o Trindade não estava bem e como estava fora de questão, nesta altura, abandonar um companheiro em dificuldades lá seguimos juntos.
Esperava-nos uma das partes mais duras da prova. A duríssima ascenção aos 3660m seguida da irracional descida de pedra e cascalho solto com uma inclinação pouco razoável e que se prolongaria durante 2000m D-

O estado do Trindade agravava-se e não estava a ser fácil progredir. A ideia seria ir até Imlil, o 3º abastecimento da prova, aos 88Km. Também da minha parte, não sei se apenas pela descida ou pelo ritmo lento e paragens contínuas, os meus pés começaram a sofrer mais do que o desejável tendo torcido várias vezes o tornozelo que já vinha frágil da subida Loriga Estrela-

Nisto, do nada surge o Paulo Martins. Vinha cheio de pica, já tinha levado pontos na canela no PC aos 3500m e tinha renascido para a vida. Lá lhe expliquei que seguia com o Trindade e acabou por seguir mais rápido.

As 6 horas estimadas para chegar a Imlil transformaram-se em 8h. Em Imlil e depois de ter de tratar novamente dos pés aparece o Sérgio Cacheirinha. Traz más notícias. Deixou a Paula Penedo no Km50 totalmente infeliz. Ia abandonar e viu-se forçado a seguir sozinho. O Trindade opta por ficar a descansar mais um pouco e seguir depois com o Sérgio e eu que só queria ver o fim à coisa meto-me ao caminho. Estes 17Km seriam feitos em 4h30 muito por culpa dos 1400 D+ mas também dado que já ia muito massacrado dos pés. Já não estava a desfrutar da prova há muito tempo.

Ainda assim foi possível fazer a prova em 25h18m tirando 1h30 ao meu tempo de 2012. Teria sido possível fazê-la em menos de 23h mantendo-me nos 30 primeiros, se tivesse sido possível manter o ritmo? Quem sabe...

De qualquer forma, depois de tanta preparação e planeamento, para mim todos os objectivos foram largamente superados, o ultimo dos quais aconteceu já ao final da tarde quando a Paula Penedo entra no quarto e surpreende toda a gente quando anuncia que tinha acabado de cortar a meta. Estávamos convencidos que tinha ficado no Km50 mas qual quê. Quando recuperou a calma decidiu acabar o que tinha ali vindo fazer. E mais nada! Meteu-se ao caminho e ainda bem. Todos tínham superado os 105Km, todos tinham conhecido e vencido o Atlas.

O meu objectivo tinha sido atingido. Sei que não terá corrido da melhor forma a todos, eu incluído, mas globalmente a viagem de descoberta do Atlas foi um enorme sucesso. Acredito que todos adoraram ir fazer o UTAT e que nunca esquecerão estes dias fantásticos que passámos, a generosidade e simpatia dos marroquinos e dos berberes, a excelente organização, a boa comida, as parvoíces e as galhofas, os boches, os douradinhos e outras palermices semelhantes, as quinquelharias marroquinas, o chupa chupa Maria, o mestre Massoud especialista em telemóveis, e tudo o resto.

Agora sei que mais alguns compreendem porque esta prova me marcou tão profundamente. Voltaremos?

Para além de algumas das fotos da viagem que podem ver neste link aqui ficam algumas fabulosas imagens. E vocês? Atrevem-se a desafiar o Atlas?