quinta-feira, 21 de julho de 2016

Haute Route - Como nasce uma aventura


Esta é a história da mais bela e fabulosa aventura que vivi. Ao contrário de feitos fabulosos apenas ao alcance de super heróis, esta é uma simples aventura feita por pessoas banais que têm em comum, não a vontade de se superarem e de fazerem cenas inacessíveis ao comum dos mortais, mas apenas a vontade de descobrir e conhecer melhor este gigantesco planeta que habitamos. Mesmo que isso implique não saber o que vai acontecer no dia a seguir, ou mesmo por vezes, no passo a seguir...



Depois da fantástica volta ao Monte Branco que fizemos no ano passado (cliquem para ler) era preciso fazer algo um pouco mais arrojado. Lançado o réptil logo o Bruno, o Eduardo e a Filipa falaram em Haute Route. Uma rota de alta montanha que liga Chamonix em França a Zermatt na Suiça ao longo de 200Km e 15000 m D+. Muitas passagens perto dos 3000m e classificada pelo pessoal das caminhadas como a mais bela rota do mundo. Eh lá!!! Isto é coisa para se fazer como no ano passado. Mochila às costas, dormir em abrigos de montanha, correr sempre que possível, vamos a ela.

Depois de pesquisar um pouco na net percebi que não havia quase informação da rota relacionada com trail run. Há alguma informação de caminhadas, muitas empresas locais que organizam viagens de 12, 13 dias, mas correr há muito pouca coisa. Ora bem, 12 dias era coisa que não tinha e ao preço que se paga na Suiça pelos abrigos, também não é recomendável demorar tanto tempo, pelo menos sem uma tenda para sair mais em conta. E correr com o que levamos já custa, tendas não faziam parte do material

E ainda uma novidade para gerir. O ano passado o percurso era circular, ou seja voltávamos a Chamonix, a nossa base de apoio onde deixámos a mala com o que não levámos durante a volta. Este ano não havia base dado que o local de chegada era diferente do de partida. Voltar a Chamonix estava fora de questão porque ficava fora de caminho. De Zermatt teríamos de ir directos ao aeroporto de Genebra. Portanto tudo o que houvesse para levar teria de ir às costas de cada um. Seria chegar a Chamonix, e seguir a nossa viagem com tudo o que precisávamos para os próximos 6 dias... Muito interessante!

A Haute Route não é como o TMB (Tour do Monte Branco). O TMB está totalmente marcado e é possível fazê-lo com um mínimo de planeamento prévio. Há alguns troços opcionais mas basicamente toda a rota está marcada. Na Haute Route isso não existe. É uma rota conceptual. Na Suiça a marcação dos trilhos é irrepreensível mas refere-se às aldeias, vilas e pontos geográficos de interesse. Aliado a isso há várias opções da rota em que se pode optar por uma ou outra etapa, ir por um lado ou por outro, descartar vilas e optar por outras. Ou seja, era necessário um planeamento rigoroso e detalhado do trajecto com antecedência. Primeiro decidir qual o percurso, quais as etapas e depois desenhar o traçado e criar o GPX. Isto para evitar indecisões no local e facilitar a progressão. As etapas eram demasiado longas e íamos com o tempo muito limitado para permitir enganos, dúvidas etc. 

Acresce a ligeira dificuldade de não conhecer o terreno, nem o percurso, nem as opções. Para complicar, o que existe online e não só, está desenhado para 12 dias. Era preciso converter para 4 ou 5 dias... Onde cortar as etapas, onde ficar a dormir?

Uma das melhores referencias é este livro do Kev Reynolds de modo que nada como começar por aí. O livro está pensado para caminheiros e para as tais 12 etapas, mas sendo muito detalhado, serviu de base para todo o planeamento.

cliquem na imagem para ver o guia na amazon UK
Não foi fácil tomar decisões, principalmente porque não conhecia o terreno nem as alternativas, o que dificulta as escolhas, mas na impossibilidade de conhecer todas as etapas lá desenhei um traçado que à falta de melhor teria de servir.

Assim e para minimizar o tempo necessário, o percurso foi partido em 4 etapas e meia. A meia seria feita logo no primeiro dia à tarde e iria levar-nos de Chamonix até à Suiça e avançar logo 24 Kms rota a dentro. No dia seguinte já poderíamos arrancar para as 4 grandes etapas com cerca de 45 Kms cada.

Reunida a equipa de malucos que aceitaram o desafio, reservados os voos e os abrigos, restava aguardar pela data enquanto íamos sonhando com o que nos aguardava. Não posso negar que depois de tudo o que li e estudei a fasquia estava muito mas muito alta. Fabulosas referencias de todo o lado diziam que nos aguardavam as paisagens mais bonitas do mundo. 

No meio de tudo isto o gostinho a aventura de não fazermos ideia do que nos esperava. Como seriam os trilhos? O desnível positivo diário era gigantesco. Seria possível? E a neve? A minha grande preocupação era a neve. Conseguiríamos passar aos 3000 m? Não levávamos equipamento apropriado para a neve. O ano passado passámos algumas zonas com neve, é verdade que fomos bem mais cedo mas também não passámos dos 2500 m de altitude. Este ano mesmo com 1 mês a mais as webcams que via aos 3000 m mostravam um cenário um pouco mais preocupante. E com tudo marcado era preciso passar e chegar cada dia ao abrigo seguinte.

E no meio deste turbilhão de emoções, depois de muita preparação, o dia acabou mesmo por chegar....

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