sexta-feira, 11 de outubro de 2019

À conquista do Toubkal, o topo do Norte de África - Dia 1, a chegada


O Toubkal com 4.167 metros, é o ponto mais alto das montanhas do Atlas, de Marrocos, do norte de África, do Magrebe e  de todo o mundo Árabe.

Este é o relato de mais uma fabulosa aventura que começou neste post. Inicialmente pensei em organizar a coisa, mas fazia sentido abrir a porta a mais participantes do UTAT, por isso a organização da prova pegou na ideia e operacionalizou o assunto. Para além de ser muito mais tranquilo para mim, a organização do UTAT tem muito mais facilidade em organizar este tipo de eventos com os seus parceiros locais. E assim foi.

A opção de subir ao Toubkal antes (ou depois) da prova, apareceu como uma opção adicional que se poderia escolher aquando da inscrição no UTAT e deixem que vos diga, quem o fez nunca mais esquecerá estes dias...

É um pequeno resumo do que foi esta aventura, que vos quero contar, mais para ficar escrito e ser um auxiliar de memória dentro de uns anos, do que propriamente conseguir transmitir-vos as sensações e as vivências do nosso grupo, porque isso como imaginam, é impossível. Mas eu conto um conto e a vossa imaginação faz o resto...


Participantes
- 9 portugueses
- 8 franceses

Staff 
- 1 guia
- 8 muleteiros (condutores de mulas com os respectivos animais)
- 1 cozinheiro

Depois de um dia gigante que incluiu até um almoço e um passeio por Marraquexe, enquanto esperávamos pelos restantes participantes, a tarde aproximava-se do fim, mesmo que o termómetro, teimosamente, não quisesse baixar dos 40 graus.

Depois do grupo todo reunido, seguimos finalmente para Imlil, base logística de todas as subidas ao Toubkal. O calor vai ficando para trás à medida que nos vamos aproximando dos 1600 m de altitude de Imlil. Na carrinha, um mini bus de 15 lugares, escabeceia-se ao ritmo das curvas e das crateras das massacradas estradas marroquinas. A maioria dos franceses segue atrás numa carrinha de 9 lugares. Sonhava-se já com uma boa refeição e uma cama que permitisse recuperar de um dia que tinha começado por volta das 5 da manhã em Lisboa.

Finalmente o mini bus entra em Imlil. Hicham, o guia que se juntou a nós logo ao fim da manhã no aeroporto e que estaria presente até ao final da aventura, já me tinha dito que não ficaríamos em Imlil mas numa aldeia logo a seguir, de seu nome Aroumd, cerca de 2 Km mais à frente.

Muitas lojas ainda abertas, tascas, hotéis e gites, desfilam por nós. A vila é minúscula, encalhada no final de um vale glaciar, mas o sítio fervilha de vida. A estrada de alcatrão acaba no final da rua e a carrinha ataca com determinação um estradão de terra batida que descreve uma curva tão apertada e inclinada que a carrinha não teve capacidade de a fazer à primeira. E se até agora as coisas tinham decorrido dentro do previsto, estava na hora de Marrocos nos recordar que estávamos em Marrocos....

O condutor tenta manobrar a coisa, marcha atrás, destroce...., mas depois com a carrinha a meio da curva e uma certa inclinação... vai lá, vai. Não é que a carrinha fosse um chasso. Pelo contrário. Até agora não tínhamos dado por grandes problemas. Até ar condicionado se esforçava por ter.

Mas alguma coisa estava a ceder, embraiagem ou transmissão, algo não estava bem. O Hicham pede para sairmos para ver se aligeirando a carga a coisa vai. E foi. O primeiro obstáculo estava ultrapassado. Toca a entrar. O estradão prossegue, a inclinação e as curvas não dão tréguas. O condutor tenta embalar para superar as zonas complicadas. Aquele não é, de todo, o terreno ideal para um mini bus, quanto mais um com problemas. Nem 500 metros fizemos quando o condutor pára de novo. Não valia a pena insistir. A segurança era mais importante e naquela carrinha não íamos seguramente fazer os 2 Km que faltavam. É o que se chama morrer na praia. Tudo cá para fora de novo.

Noite cerrada, no meio do nada, Imlil ficou lá para trás. O resto do grupo, os franceses, aguardam na outra carrinha, essa com capacidade de atacar o que faltava. O Hicham diz que vamos aguardar ali um pouco, que vem outra carrinha. Tira malas, tira tudo. Poucos minutos depois lá vem outra carrinha, uma espécie de pick-up, caixa aberta, com grade em cima, para transporte de gado.

O Hicham fala com o condutor que apareceu, não percebemos nada da conversa mas a coisa estava animada. Ah! Marrocos enfim a dar um ar da sua graça. Toca a carregar as malas para esta pick-up. Mas não só as malas. A seguir às malas fomos nós. Tudo lá para trás, tirando 3 que foram lá para a frente. Enquanto não arrancamos ainda caem umas pingas, mas a temperatura estava excelente, felizmente. 

A carrinha arranca enfim com uma inversão de marcha animada no estradão que de repente parecia estreito. Vai à frente, vem atrás, a coisa lá foi. Espírito aberto e boa disposição de todos a ajudar.

Com jeito passamos o tronco pelas grades superiores da pick-up e lá vamos, em pé, a desfrutar daquela viagem louca. Parece que em Marrocos as nossas aventuras estão destinadas a incluir viagens em pé na caixa de pick-ups. O filme não está grande coisa devido à falta de luz, mas aqui fica.


Ainda bem que o mini bus borregou. A pick up papava o estradão como se nada fosse, mas as curvas em cotovelo a subir, nunca jamais em tempo algum o mini bus conseguiria fazer aquele troço final.


Lá atrás o pessoal divertia-se como se fosse normal viajar assim. Mas os 2 Km rapidamente acabaram. Via-se um aglomerado de casas e luzes adiante. Saímos da pick-up e seguimos por um trilho iluminado a telemóveis. As malas grandes iriam lá ter, fosse onde fosse que nos dirigíamos, seguramente ao local onde iríamos jantar e dormir.

Alguns dos franceses não estavam a perceber bem o espírito da coisa. Seguramente também alguns dos tugas... A aldeia estava ali mas metemos por um trilho, noite cerrada, sobe, sobe, vira aqui, vira ali, é aqui, ainda não, sobe mais um pouco, contorna. Aos poucos contornámos a aldeia e subimos até chegar enfim ao nosso gite de montanha. Umas casitas agregadas numa pequena encosta. Tudo arranjadinho em vários níveis numa pequena encosta. 


As malas haveriam de chegar pela parte de cima, carregadas às costas por marroquinos. Procedeu-se à distribuição de quartos e rapidamente estávamos numa sala comum, onde enfim se tomou um chá enquanto não chegava o jantar. 

Procurava-se rede para confortar quem cá ficou e dizer que estava tudo bem. Subindo até ao topo, de vez em quando lá vinha um pouco de rede 4G, dava para as encomendas. Mas a história do router Wifi que vivia numa gaiola, terá de ficar para quem a viveu in loco. Ainda lhe fizemos um reset, e a imagem da velhota que ali vivia, com a caixa e os manuais às voltas, parecia saída de um filme cómico. No final percebemos que alguém tinha trocado a password recentemente e que ninguém por ali sabia a nova password. 

Pouco importa. A pouca rede deu para avisar que estava tudo bem e o que o pessoal queria mesmo era comer, preparar as mochilas para o dia seguinte, e uma noite de sono recuperador.



E foi isso mesmo que fizemos. Depois de um dia em cheio, dormimos que nem uns meninos, no sossego das montanhas, a pensar na subida ao Toubkal que estava prestes a começar.

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